Sentimentos de Esther


Esse aqui não é um post da Semana Esther, é um post tardio. Não é uma resenha, tampouco, e ainda não sei se me decidi sobre o que esse post vai ser. Eu sei apenas que: eu preciso escrever sobre o que senti ao ler A Estrela Que Nunca Vai Se Apagar, porque tem  muita coisa presa no meu peito e escrever é um dos jeitos que eu uso para meio que... me livrar de alguns sentimentos. De vez em quando, gosto de pensar que um papel e uma caneta (ou, nesse caso, uma tela branca e um teclado) são a minha penseira (um objeto mágico de Harry Potter que serve, grosso modo, para guardar memórias quando sua cabeça está cheia) no mundo real. Aqui eu deposito as minhas sensações, emoções, comentários, profundas reflexões sobre tudo o que eu leio, vivo e respiro. É por isso que eu decidi fazer esse post. Não esperem nada MUITO articulado, porque ele é basicamente isso mesmo: um punhado de emoções jogadas no meio de um texto, que estão aqui com caras diferentes das que eu realmente senti. Porque o jeito com o qual eu senti esse livro foi inimaginavelmente profundo. Não necessariamente triste, não necessariamente lamurioso. Mas muito profundo!

Então, nesses dias, eu finalmente tomei coragem e enfrentei o livro de frente. Eu sabia que a história era pesada, e continha os relatos da vida de uma adolescente que teve a temida doença do C - câncer! Oi, vó, eu falei o nome da doença-que-não-deve-ser-nomeada! - e que o final dela foi, como todos sabem, a morte em 2010. Eu tinha uma ideia até que bem grande da vida da Esther, porque me lembro bem de quando eu descobri esse mundo novo da nerdfighteria e me falaram de quem ela tinha sido e me mandaram links com os vídeos dela e os do John. Infelizmente, Esther já havia falecido quando eu descobri quem era o John e quem eram os nerdfighters.

Quando comecei a leitura, me senti até que muito bem. A introdução do John Green é bastante triste, mas logo depois a história de uma garotinha forte, feliz, meio travessa e muito linda começa a se delinear nas páginas, que fluem com pensamentos e fotos da Esther. Desde antes do diagnóstico, percebia-se que Esther era uma menina diferente. Mas não diferente porque ela fosse "anormal" ou porque ela era um ser inatingível e insuperável, mas diferente como qualquer outra criança fã de Harry Potter, de outros tipos de livros e com uma imaginação muito fértil (o que foi? Nem vem. É difícil achar crianças com tanto gosto por leitura hoje em dia, viu?).

Conforme a leitura foi progredindo, eu me sentia como quando estamos em um funeral de uma pessoa muito próxima. Quem já passou por isso, sabe do que eu vou falar agora: enquanto nós estamos ali do lado do caixão, velando, a dor é muito grande, mas parece que a ficha ainda não caiu. Quando, finalmente, saímos do enterro, voltamos pra casa e percebemos que a pessoa se foi é que a dor vem mais forte, mais sentida. A ficha cai. Foi exatamente assim: enquanto lia as cartinhas e bilhetes e transcrições de vídeo e postagens da Esther, a ficha ainda não tinha caído. Entretanto, próximo do fim iminente do livro e, consequentemente, da vida da Esther, fui me sentindo cada vez mais preenchido de um misto de tristeza e fascínio. E quando, por fim, li o relato do pai de Esther sobre sua morte, parece que me dei conta: aquela menina foi real. Existiu de verdade, e morreu de forma dolorosa e verdadeira.

Eu sei que a gente não deve ficar exaltando a dor da Esther e a tomar como exemplo apenas pelo câncer, porque não foi o câncer que definiu quem ela foi. Foi ela mesma! Ela mesma foi diferente, ela mesma lutou para diminuir a ruindade que existe no mundo. E nada disso (talvez uma parte ínfima) foi por causa do câncer. Entretanto, não tem como não ler sobre o sofrimento de uma inocente e ficar indiferente. Por isso, nesse momento, engoli fundo, senti o nó na garganta, senti a vista embaçar, mas tentei me segurar ao máximo pra não chorar. É claro que se deve chorar em funerais, mas isso é uma grande comemoração pela vida de Esther. Não um funeral. E percebam só, bem aqui, esses sentimentos conflitantes EVERYWHERE. Já nem sabia bem o que estava sentindo. Só sabia que doía em alguns lugares bem dentro de mim.

Foi assim que me lembrei da aula de Literatura Brasileira que tive de manhã, e como estou estudando o Modernismo, falávamos de Manuel Bandeira. E o que é que Manuel Bandeira tem a ver com a Esther?, você me pergunta. E agora, vou dar uma de tio chato e fazer um recorte na história do Bandeira, que foi o que me fez lembrar da Esther (se você já souber a história do Bandeira, tá permitido pular o próximo parágrafo).

Manuel Bandeira era um jovem que nasceu em 1886 e foi muito feliz durante toda a sua infância. Corria, pulava, brincava e era muito parecido com qualquer outra criança (de 1886, cof cof). Ele nasceu em Recife, mas mudou pro Rio de  Janeiro e depois pra Santos e aí, depois de um vai-e-vem maluco, finalmente ele vem para São Paulo para estudar na Escola Politécnica com 17 anos, para então realizar o sonho de ser Arquiteto. Entretanto, no final de seus 17 anos, Manuel Bandeira recebe uma terrível notícia: tem tuberculose, e como ele mesmo diz, "O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado./- Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?/- Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino." Os médicos desenganam Bandeira para seus pais, e disseram que o, até então, menino, não iria durar mais do que alguns meses. Manuel, então, profundamente traumatizado por viver com a constante sombra da morte em cima de si, começa a escrever os seus primeiros poemas. Ele escreve, escreve, escreve, escreve, e só viria a publicar seu primeiro livro de poemas em 1917, com 31 anos, chamado "A Cinza das Horas". Nesse livro, os poemas são basicamente sobre a agonia de conviver com a morte, classificados como penumbristas. O livro reúne poemas desde quando ele tinha 17 anos. A história depois disso não é exatamente o que me fez lembrar da Esther, mas esse recorte temporal em específico.

Assim como Esther, Bandeira também passou por momentos desesperadores, de dor e da vista da morte desde cedo em sua vida. Ele tem poemas profundíssimos sobre isso, e enquanto meu professor declamava alguns deles, pude sentir que, se Esther tivesse ouvido Bandeira, talvez se identificasse profundamente com o que ele escreveu. Só pela ocasião, deixo aqui um poema do Bandeira do livro A Cinza das Horas:

Inscrição
Aqui, sob esta pedra, onde o orvalho roreja,
Repousa, embalsamado em óleos vegetais,
O alvo corpo de quem, como uma ave que adeja,
Dançava, descuidosa, e hoje não dança mais...

Quem não a viu é bem provável que não veja
Outro conjunto igual de partes naturais.
Os véus tinham-lhe ciúme. Outras, tinham-lhe inveja.
E ao fitá-la os varões tinham pasmos sensuais.

A morte a surpreendeu um dia que sonhava,
Ao pôr do sol, desceu entre sombras fiéis
À terra, sobre a qual tão de leve pesava...

Eram as suas mãos mais lindas sem anéis...
Tinha os olhos azuis.... Era loura e dançava....
Seu destino foi curto e bom...
                                                        - Não a choreis."
(BANDEIRA, Manuel. In: A Cinza das Horas, 1917.) 

Enfim, chega de matraquear em cima de uma coisa  muito nada a ver. Sempre tive muito medo de falar da Esther, porque parecia que tudo o que eu tentava dizer era errado, não era exatamente o jeito com o qual a sua vida deveria ser encarado, era diminuição, era uma infinidade de coisas que minha cabeça criou para que eu não falasse sobre ela. Entretanto, agora, depois de ter lido AEQNVSA, posso dizer que compreendi a  história dela de um jeito muito maior, e fico muito feliz com isso. O livro me mudou demais, e me fez perceber coisas incríveis, além de me fazer agradecer pela minha vida muito mais vezes do que eu já costumava fazer.
Comentários
5 Comentários

5 comentários:

  1. Renato, me emocionei ao ler seu post e não poderia deixar de comentar.
    Estou louca para ler AEQNVSA, e dou de cara com essa postagem incrivelmente linda. Muito obrigada por expor suas emoções quanto ao livro, vou hoje mesmo comprar o meu :)
    História como a de Esther, nos mostra como somos ingratos a maioria das vezes.
    Mais uma vez, parabéns.. amei!

    Abraços !

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  2. Renato que belas palavras, ás vezes a gente não tem como descrever os sentimentos... e você me emocionou em várias linhas, a ternura com que você escreve mostra a ternura que sentiu ao ler a história!
    http://felicidadeemlivros.blogspot.com.br/

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  3. Lindas palavras nesse post Renato... Me emocionei também, e esse poema é liindo.. Parabéns pelo blog e sucesso ..Alanna Moura

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  4. que bom você ter conseguido por para fora seus sentimentos sobre essa leitura e mais especificamente sobre a Esther, em forma de homenagem - na minha opinião, e ficou boa.
    não conhecia a história do Manuel Bandeira, bem interessante.

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  5. renato Amei a historia bom n nesse sentido deixe comessar de novo.Renato a historia e linda e emociona quero ler o livro isso mostra como somos engratos temos que levantar a mao e agradecer .beijo de monick (ps vom travalho)

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