Você tem vergonha de ler?

Vi lá no Literatortura um vídeo chamado "O BEST SELLER RUIM QUE EU GOSTEI E TENHO “VERGONHA” DE ADMITIR", e estava escrevendo um texto gigantesco como comentário para o que eu queria expressar ao assistir o começo do vídeo. Só que ia ficar um comentário gigantesco lá e eu achei que seria legal trazer esse tema pra ser discutido aqui no blog, porque acredito de verdade que isso deve ser discutido em torno de toda a "blogosfera literária" atual. (Vamos começar a trazer as discussões que rolam no Sr. Cinza para um âmbito menos anônimo!)


Pra começar, precisa ficar claro aqui que não estou criticando o vídeo e nem o Gustavo, aliás, justamente o contrário disso. Concordo com ele plenamente enquanto ele explica o motivo do vídeo, nos minutos iniciais. Acho apenas que existe uma predominância muito grande dessa ideia de "alta literatura" e "baixa literatura" em todos os blogs literários da atualidade, e estou tentando entender demais o que tem acontecido mas não tenho conseguido. Eu acho essa ideia de "ter vergonha" de gostar de algum best-seller é uma coisa tão zuada que de vez em quando sinto uma coisa dentro de mim, uma vontade de gritar loucamente, porque nem tudo pode ser categorizado assim. Tem muita gente (inclusive vários professores de Letras, vamos ser sinceros) que dizem que tudo o que é best-seller não é bom. Só porque, vejam só, uma grande massa se identificou e comprou. Para eles, tudo o que vende muito e é cultura de "massa", isso é, de "gente pobre de cultura", não vale a pena, e por isso passam reto pelas prateleiras de best-seller na livraria. Mas gente, será que isso tem mesmo sentido? Outro dia rolou uma pequena polêmica entre os blogs porque criticaram quem tinha lido um livro best-seller, dizendo que as pessoas se contentavam com pouco. Não quero entrar em âmbitos de discutir quem é a pessoa, em que contexto ela falou isso e nem nada do tipo (porque eu tenho certeza que todos nós, sem exceção, já acabamos classificando um livro como ruim e zuando os nossos amigos que leram aquilo), mas estou tomando a fala como um exemplo de que isso é realmente verdade: nós temos mesmo essa mentalidade! Isso acontece de verdade. Não é só um pensamento isolado de pessoas cultas: nós, entre nós, pensamos isso.


Proponho, então, que a gente analise isso de um outro jeito. Assim como o Gustavo expôs no vídeo, não importa muito se o livro é bom ou ruim, se com um grau super alto de "cultura" ou baixo, não importa muito o que o livro representa: se ele foi importante pra você, ele foi bom pra você, e dizer que gostou dele não é nenhum motivo de vergonha. Digo isso porque estudo literatura e vejo muita gente olhando torto quando digo que leio livros e faço resenhas pra blog, porque aparentemente uma pessoa "culta" não deve se deixar "contaminar" com "baixa literatura". Baixa literatura é livro comercial? Baixa literatura é YA? O que é baixa literatura? Baixa literatura é Nicholas Sparks? Fico pensando se devemos considerar John Green baixa literatura... o tanto de filosofia envolvida em Quem É Você Alasca? é gigantesca, e todos os livros trazem discussões sérias sobre determinadas questões que, muitas vezes, são até tratadas como tabu para algumas pessoas (como a morte, o câncer, etc) Até onde vai a baixa literatura, até onde devemos ter vergonha de determinado tipo de coisa que lemos, até onde essa coisa de "vergonha" de ler best-seller vai? Isso me deixa muito bravo todos os dias, porque vejo gente se privando de ler livros super legais pela fama deles. Não admito que me privem das minhas leituras porque alguém determinou que o que eu estou lendo é "livro ruim", sabe?



Ano passado tivemos uma discussão interessante na faculdade sobre o que era "literatura de massa" e o quanto a literatura de massa do passado hoje é estudada na faculdade. Logo que Jane Austen lançou seu primeiro livro, ele tinha tudo para não ser bem aceito: por mais que a primeira publicação dela não tenha sido nominal, ela era mulher, escrevendo em 1775 e, na época, vejam bem, se discutia se o romance era realmente um gênero literário e, não muito diferente de hoje em dia, se era de qualidade. Atualmente, Jane Austen tem um papel muito importante na literatura do que chamamos de "clássicos" e até mesmo "canônicos". A trajetória que ela cursou é grandiosa, e hoje em dia existe um epitáfio em seu túmulo em que se lê: "Ela abriu sua boca com sabedoria e em sua língua reside a lei da bondade". E tudo isso começou com romances. Romances como muitos dos que lemos hoje.


Não sei se devemos classificar certos livros entre ruins e bons e, mesmo os que classificamos como ruins (seja por escrita, por personagens, por qualquer outra coisa do tipo), não devemos julgar como um "lixo" de trabalho porque devemos pensar que tudo o que chegou às prateleiras passou por análise. Foi uma pessoa que escreveu tudo aquilo! Ela teve trabalho. Não devemos apenas olhar como "lixo", mas sim entendermos porque aquilo está ali, porque fez sucesso, porque estão lendo. Acho que tudo é uma questão de pontos de vista, e não devemos querer ter razão absoluta sobre as coisas (assim como eu não quero ter razão absoluta sobre isso! É por isso que peço que se manifestem nos comentários.)

Concluindo, não estou dizendo aqui que não devemos ler clássicos e nem o que hoje é considerada "literatura canônica", mas estou dizendo que não devemos jogar numa lata do lixo tudo o que hoje vende, seja por qualquer motivo. Devemos, sim, ler clássicos, termos contato com outras realidades que não a nossa, contemporânea, mas sem ignorarmos o contexto atual em que vivemos. E, claro, não julgarmos a nós mesmos por lermos literatura "de massa". Até porque, ela é legal demais! E, afinal, todos nós podemos ler o que quisermos em qualquer momento da vida.
Comentários
15 Comentários

15 comentários:

  1. Entendo totalmente. É a mesma coisa que ao mesmo tempo eu ler e gostar de algo clássico e ao mesmo tempo ler YA ou algo do tipo. Tento não classificar algo que não gostei como ruim, e sim como: não é pra mim. E odeio a ideia de que temos que ser limitados a gostar de um tipo de genero, quero liberdade de ler e gostar do que eu quiser.
    Ótimo post!
    bjs

    ResponderExcluir
  2. a leitura tem que fluir, não importa se é cult ou não
    a gente não pode ser julgado por aquilo que lê!
    http://felicidadeemlivros.blogspot.com.br/

    ResponderExcluir
  3. As editoras descobriram esse filão YA e andam lançando adoidado. Assino news de váááários blogs literários e já percebi que o quase todo mundo está lendo é YA mesmo. Eu leio também, apesar de não ser minha leitura preferida, detestei muitos idolatrados, gostei de outros, fiquei indiferente a outros tantos.
    O que me incomoda é que tem muita porcaria nesse meio, traduções lixo, histórias rasas, mas que fazem sucesso mesmo assim. Não gosto muito do "pelo menos está lendo", isso não funciona para sempre. Mas isso não quer dizer que tem que ler - só - Machado ou Camões. Só acho que tem que diversificar, não ficar lendo só o mesmo tipo de coisa. E eu li um monte de livros que já percebi que colocaram na lista dos #sintavergonha, mas e daí? Como eu poderia resolver se é bom ou não sem ler? O negócio é ler de tudo, sem preconceito, tem coisa boa é todos os tipos de leitura.

    ResponderExcluir
  4. É difícil a gente não olhar pra um livro que lemos e achamos horroroso sem pensar "que lixo...", porque julgar um livro depende muito de quem tá fazendo esse julgamento e porquê. Se alguém que só lê clássicos e coisas "cultas" considera YA um lixo, por exemplo, eu fico irritada, mas não tenho nada com isso - é a interpretação dessa pessoa. Meu problema começa quando essa mesma pessoa aponta o dedo pra outra e julga quem ela é pelo que ela leu ou lê. Tem uma diferença muito grande entre dizer "acho o livro X um lixo" e dizer "acho o livro X um lixo e todo mundo que lê isso não sabe o que é bom e só lê porcarias". Não sei se expliquei direito oO

    ResponderExcluir
  5. Concordo plenamente com você Renato!
    Acho ridículo quem sai julgando livros só pelo fato de serem best sellers. E ainda mais quem classifica o outro como "burro" por aquilo que gosta de ler. Faz uns dias que vi uma lista publicada por um site onde o título era mais ou menos assim: "Livros para idiotas." e eu achei aquilo patético, mesmo. Como se alguém tivesse o poder de fazer esse tipo de julgamento.
    E eu também acho que se tem gente lendo e gostando é porque tem algo de especial, sei lá. Eu gosto de Twilight e sei que muita gente diz que é "lixo" mas se não fosse pela série eu não teria conhecido pessoas incríveis e nem Jane Austen (talvez mais tarde). Às vezes vai muito além da leitura em si.
    Ótimo post! Estava precisando ser dito.
    Beijos!

    ResponderExcluir
  6. Olá,
    Concordo com você.
    Eu acho que existem dois grandes problemas em relação ao assunto.

    O primeiro é que a maioria das pessoas não pensam que a opinião é algo muito pessoal. Que o que é bom para um pode não ser para outro. E que é extremamente enriquecedor culturalmente termos essa diversidade de preferências literárias.

    O segundo é o problema de querer "elitizar" a literatura. Acredito que a literatura possui duas funções, divertir e educar. E por que elas devem estar separadas? Então para as pessoas que pensam assim (que existe literatura menor), vale mais ler um clássico e não entender nada do que ler um best-seller e absorver algo? Eu acredito que aprendemos com todos os livros que lemos.

    Bem, gostei bastante do seu texto. Parabéns pelo trabalho.
    Até mais.

    http://minhaqueridasophia.blogspot.com.br/

    ResponderExcluir
  7. Eu acho que todo livro é bacana e se ele foi publicado, é porque alguém teve ideias e trabalho para escrevê-lo e uma equipe concordou que seria bacana publicá-lo, basta que a gente encontre os livros que mexem conosco, e sim! Eu gosto de best seller, desde que a leitura flua.
    Beijocas ^^

    ResponderExcluir
  8. Concordo totalmente com todo seu texto.
    Mas, gostaria que blogs adolescentes tivessem mais resenhas de literatura clássica ou literatura adulta, pois ficar no mesmo gênero voltado para adolescentes é muito fácil.
    Não acho nada ruim os livros voltados para adolescentes, mas é bom variar a leitura, ler algo mais difícil, para assim abrir mais a mente e enriquecer ainda mais seus conhecimentos.

    ps: livros da Companhia da Letras são excelentes, e nunca vejo resenhas deles, por ser uma editora voltada para o público adulto.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Aqui no blog mesmo tem, Shadai! Dê uma busca por Cia. das Letras ali no campo de busca que vai encontrar.

      Valeu pelo comenário!!

      Excluir
  9. Sinceramente, eu acho um saco quando uma pessoa diz que leu tal e tal livro, daí eu vejo que ela só lê livros considerados "clássicos", e então ela acha que é mais inteligente ou culta por isso. Ler Machado de Assis ou outros autores não me fazem achar que a pessoa é mais inteligente ou interessante. Uma coisa é você gostar de verdade disso(o que eu não entendo, poque muitos clássicos são longos, chatos e com uma linguagem muito rebuscada). Eu gosto de ler muita coisa, leio muitos livros de adolescentes também(e olha que eu nem sou uma), com aqueles título bobos, mas que quando você os lê, gosta de verdade. E eu amo best sellers, não me importam se já estão manjados ou todo mundo está lendo. Mas confesso que morro de ciúmes quando todo mundo começa a ler algo que eu gosto. rs

    ResponderExcluir
  10. Concordo com você Renato!
    Eu, por exemplo, comecei a seguir esse blog anos atrás e continuo lendo os posts, porque a Ceile tem os mesmos gostos que eu, Crepúsculo despertou o gosto para a minha leitura e até hoje gosto muito, vejo que ela também gosta e não tem vergonha, diferente de muitas pessoas que começaram por ele, gostam e hoje dão uma de que não gostam por ser popular e etc, me irrita ao extremo, claro que cada um pode vir a encontrar leituras que a agradem mais e tal, mas não devem desprezar só para "sair bonito na fita".
    Claro, que temos que ler clássicos, mas sabe de uma coisa, acho que li uns três clássicos na minha vida e não gosto. Eu gosto mesmo é de best seller, e não me envergonho.
    Tanta gente diz que o importante é ler, mas julgam as pessoas pelo tipo da leitura.
    Não dá para entender mesmo. Conforme lemos mais livros, claro que nossa criticidade aumenta, mas nem por isso significa que vamos amaldiçoar os livros populares e tal.
    Eu tenho aula de literatura, mesmo não sendo esse o meu curso, e a professora também fez o mesmo comentário que aconteceu na suas aulas...
    Mente aberta é ler somente os livros que te fazem aparentar ser culto ou ler de tudo um pouco, independente do que julgam?
    Bom texto o seu! Fazia tempo que eu pensava a mesma coisa e não tinha como expressar, e você fez isso! :)

    ResponderExcluir
  11. Não puder deixar de parar e comentar nesse seu post. Renato, você disse tudo que eu penso e mais um pouco. Parabéns por levantar essa discussão. Gostar de livros best seller é quase um tabu na sociedade atual. Acabei de me formar em Direito, imagine só a cara das pessoas quando eu dizia que lia YA, Chick Lit, etc. Não me envergonho de dizer que Crepúsculo despertou de vez meu gosto pela leitura. Também não me importo em dizer que li mais de uma vez cada livro da Trilogia 50 tons. As pessoas tem que parar de se envergonhar. Ler é o objetivo principal, não importa o que, não importa onde (lei no ônibus!)... Claro que devemos buscar aprimorar nossas leituras e o senso crítico. Hoje em dia, depois de ler centenas de livros, mudei um pouco minha opinião sobre Crepúsculo, realmente existem incoerências e falhas narrativas, mas nem por isso eu deixei de gostar do livro e do que ele proporcionou para a minha vida. Gostei de mais da postagem e do tema. Mais uma vez: Parabéns!!!

    ResponderExcluir
  12. Ah, obrigada por esse post! Sinceramente, me incomoda demaaais quando as pessoas julgam as outras por suas leituras. Cada um lê o que quiser, e isso não te torna melhor ou pior. Conheço pessoas que só leem clássicos e, sinceramente, algumas delas parecem entediadas (outras não, viva a diversidade). Ninguém deveria ter vergonha do que lê. E acho que a gente deve se livrar também de um discurso que eu ouço bastante, dizendo que "ah, pelo menos a pessoa está lendo algo, né". Como se "ler algo" fosse obrigatório e enaltecedor. Não, a pessoa pode muito bem não gostar de ler também, ué. Cada um faz o que gosta!

    O post ficou excelente, parabéns. Você comentou sobre YA, e aqui está um link bem interessante (em inglês) que talvez interesse, sobre como YA ensinou alguns estudantes (que já liam bastante) a amar a leitura: http://publishingperspectives.com/2014/06/how-ya-books-engender-a-true-love-of-reading-in-my-students/

    http://blogsemserifa.wordpress.com

    ResponderExcluir
  13. Adorei o texto. Eu não tenho a menor vergonha dos livros que eu leio. Porém o meu pai tem. Hoje, inclusive, fui pedir o cartão dele para pagar uns livros que vou comprar, e pagaria o dinheiro pra ele. Ele disse que não ia me emprestar que estava na hora de ler livros com mais conteúdo. D:

    ResponderExcluir

Deixe sua opinão ;)

Comentários ofensivos serão excluídos.
Caso tenha um blog, deixe o link no final do comentário.